Protocolos de Consulta de Povos Indígenas e Tradicionais do Sul do Amazonas são apresentados durante o ATL 2024

  maio 6, 2024

Durante roda de conversa no Acampamento Terra Livre, foram apresentados 13 protocolos produzidos por povos impactados pelas obras da BR – 319,  no Sul do Amazonas

Por Webert da Cruz / IEB e  Thiago S. Araújo / IEB

Em 24 de abril de 2024, durante o terceiro dia do 20º Acampamento Terra Livre (ATL), na tenda da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), lideranças indígenas e extrativistas da região sul do Amazonas apresentaram 13 novos protocolos de consulta de povos tradicionais atingidos pela BR-319. A anunciação desses protocolos ocorreu numa rodada de discussão focada no mapeamento dos Protocolos de Consulta da Amazônia Indígena.  

Durante a atividade, foram lançados primeiramente nove protocolos de consulta, abrangendo a diversidade de povos indígenas do sul do Amazonas. Entre eles estavam os protocolos dos povos Tenharin, Parintintin, Jiahui, Juma e Kagwahiva, Mura da Terra Indígena Lago Capanã e da região do Jauari e Apurinã das Terras Indígenas Apurinã do Igarapé São João e do Igarapé Tawamirim de Tapauá. Além disso, foram apresentados outros quatro das comunidades tradicionais do Território de Uso Comum (TUC) do Rio Manicoré, da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Amapá, do Lago do Capanã Grande e do Projeto de Assentamento Agroextrativista Jenipapo, todos localizados na região de Manicoré (AM).

Nilcelio Jiahui, da Organização dos Povos Indígenas do Alto Madeira (OPIAM), ressaltou a importância destes protocolos  para o diálogo entre as comunidades,  governo e empresas: “Esses protocolos estabelecem como queremos ser consultados sobre grandes projetos que impactam diretamente nossas vidas e territórios,” disse Nilcelio. Ele destacou a necessidade dessas ferramentas em contextos de grandes obras, como as obras da BR-319, que provocam intensos debates sobre seus impactos ambientais e sociais no território.

Nilcelio Jiahui, da Organização dos Povos Indígenas do Alto Madeira (OPIAM). Foto: Webert da Cruz / IEB

Direito a Consulta Livre, Prévia e Informada

Vanessa Apurinã, gerente de monitoramento territorial da COIAB, destacou a importância crítica dos protocolos de consulta para as comunidades indígenas e tradicionais. “Os protocolos de consulta representam mais do que simples documentos; eles são os pilares fundamentais que sustentam o diálogo respeitoso e equitativo entre as comunidades, o governo e as empresas,” afirmou Vanessa. “Eles são a expressão concreta da autodeterminação e da soberania dos povos sobre seus territórios e modos de vida.” Vanessa também observou que, embora em muitos lugares esses protocolos não sejam respeitados, quando aplicados corretamente, “podem contribuir significativamente para uma gestão mais eficaz do território, garantindo a proteção dos direitos das comunidades e a preservação de suas tradições e recursos naturais.”

Representando as populações extrativistas, Silvia Helena, da Secretaria de Direitos Humanos do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), enfatizou a função dos protocolos como camadas de proteção e ferramentas para influenciar as políticas públicas direcionadas para os territórios. “Eles nos defendem de incursões não autorizadas e permitem uma interação sob nossas regras, com órgãos governamentais, além de influenciar as políticas que impactam diretamente a vida em nossos territórios,” explicou Silvia.

Comitiva de lideranças das comunidades extrativistas do PAE Jenipapo, TUC RIo Manicoré, RESEX Capanã Grande e RDS Rio Amapá, da região de Manicoré – AM. Foto: Thiago S. Araújo / IEB

Reginaldo do Nascimento, presidente da Associação dos Moradores Agroextrativistas do Lago Capanã Grande (AMALCG), RESEX Capanã Grande (AM), destacou a importância da união entre as comunidades indígenas e tradicionais na elaboração dos protocolos de consulta, ressaltando a necessidade de utilizar-los e incidir sobre os governantes, quando necessário, para garantir seus direitos.

O evento proporcionou um espaço para troca de experiências entre diferentes guardiões da floresta, consolidando os protocolos como ferramentas essenciais na defesa de direitos e gestão dos territórios de povos indígenas e comunidades tradicionais. “Eu recomendo que os territórios que ainda não construíram seus protocolos busquem parcerias para elaborarem os seus próprios, a fim de garantir seus direitos à consulta e à autodeterminação. A consulta deve ocorrer com os parentes, da forma como cada povo determina, porque o Brasil é signatário da Convenção 169, e é obrigação do Estado nos ouvir”, concluiu Nilcelio.

Formações e Diálogos

Marcela Menezes, da coordenação colegiada do Programa Povos Indígenas do IEB, explicou que os povos impactados pela pavimentação da BR-319 desenvolveram seus protocolos de consulta em seus próprios territórios, em um processo iniciado em 2020, com a formação de pesquisadores indígenas.  Desde então, técnicos dos programas de Povos Indígenas e Ordenamento Territorial do IEB vem prestando apoio às comunidades da região para a elaboração desses  protocolos de consulta. 

Roberta Andrade, coordenadora do programa de Ordenamento Territorial (ORDAM) do IEB, destacou a função dos protocolos: “Eles atuam como ferramentas de proteção e diálogo. Quando utilizados de acordo com as normas de consulta prévia, livre e informada estabelecidas pela Convenção 169 da OIT, e realizadas de boa-fé, facilitam acordos benéficos entre as partes.” Ela acrescentou: “Aplicados corretamente, esses protocolos previnem conflitos e asseguram que os projetos desenvolvidos em territórios indígenas e tradicionais respeitem plenamente os direitos desses povos.”

Comitiva dos povos Parintintin, Jiahui, Tenharin, Juma, Kagwahiva do sul do Amazonas, Mura do Lago Capanã e Apurinã das Terras Indígenas São João e Igarapé Tawamirim de Tapauá – AM, apresentando seus protocolos de consulta. Foto:  Thiago S. Araújo/ IEB

Ao final da roda de conversa, Nilcelio expressou sua satisfação com o lançamento desses protocolos de consulta, que representam a síntese de um longo processo de reflexão, condensado em um documento. Ele ressaltou que esses protocolos também são instrumentos que possibilitam a construção de agendas com órgãos governamentais para o diálogo com os povos indígenas.

Conheça os protocolos de consulta dos povos indígenas do SulAM apresentados no ATL:

Protocolo de consulta do Povo Apurinã das Terras Indígenas Apurinã do Igarapé São João e Apurinã do Igarapé Tawamirim

Protocolo de consulta do povo Tenharin do Igarapé Preto

Protocolo de consulta do Povo Indígena Pain Jiahui

Protocolo de consulta da Terra Indígena Juma

Protocolo de consulta do Povo Parintintin das Terras Indígenas Nove de Janeiro e Ipixuna

Protocolo de consulta da Terra Indígena Tenharim Marmelos

Protocolo de consulta do Povo Mura e Munduruku

Protocolos de Consulta das Comunidades Tradicionais

(Em breve disponível para download!)

Os Protocolos de Consulta apresentados no ATL são parte do Projeto de Salvaguardas Sociais e Planejamento Territorial no Corredor da BR 319, apoiado pela Fundação Gordon & Betty Moore. A próxima etapa do projeto inclui a reprodução em escala dos protocolos, a elaboração de cartazes e ações de fortalecimento, divulgação e incidência política. Está previsto também o início de um Programa de Formação em Salvaguarda e Defesa de Direitos, visando capacitar lideranças de povos indígenas e comunidades tradicionais da região.