Pela primeira vez em terras sul-africanas, IEB participa de encontro sobre gestão de conhecimento com organizações do Sul Global

  março 25, 2024

Encontro de parceiros de gestão e intermediação do conhecimento do Programa Vozes pela Ação Climática Justa (VAC) reuniu representantes de 8 países diferentes

Como a sociedade civil e movimentos de países tão diversos entre si como o Brasil, Bolívia, Paraguai, Tunísia, Quênia, Zâmbia, África do Sul e Indonésia podem colaborar, trocar experiências e ideias, construir conhecimento e fazer com que aprendizados dentro de seus contextos possam servir para pares em outros cantos do Sul Global? 

De 26 de fevereiro a 1° de março, o IEB esteve pela primeira vez em terras sul-africanas, na Cidade do Cabo, debatendo as ações, desafios e oportunidades dos parceiros de Gestão e Intermediação do Conhecimento do Programa Vozes pela Ação Climática Justa (VAC), dentro e fora das fronteiras de cada país, no Encontro de Parceiros de Conhecimento da South South North (SSN), organizadora do evento e parceira do IEB no programa.

Durante os cinco dias de encontro, o grupo aprofundou a compreensão coletiva do papel de gestão e intermediação de conhecimento dentro do programa, ampliou a coesão entre as diferentes regiões e trocou sucessos e desafios de VAC em cada país. A programação contou com oficinas sobre contação de histórias, ferramentas para intermediação do conhecimento e metodologias para monitoramento e avaliação de projetos, visitas a locais históricos que permitem a compreensão do território do Cabo sul-africano e dois simpósios: um entre os parceiros do programa e outro com organizações sul-africanas que trabalham com diversos temas dentro da agenda climática.  

Apesar das diferenças, as histórias de colonização se cruzam e os pontos de contato são muitos. A injustiça climática e o racismo ambiental, temas chave do programa VAC, são decorrência dos tortos modelos de “desenvolvimento” e visões de mundo impostos pelo Norte Global ao redor do planeta nos últimos 5 séculos, fazendo com que as raízes das questões tratadas em cada região sejam muito similares.

Com representantes de países impactados por esse modelo que insiste em acreditar que é a sabedoria hegemônica, um encontro como esse torna mais evidente que as soluções estão no Sul, e estão espalhadas principalmente pelos inúmeros povos e gentes que insistem em resistir em seus territórios, com seus modos de vida e jeitos de se relacionar com o mundo.

Trocar metodologias e construir junto com parceiros apenas do Sul Global, sem interferência, é raro e precioso. Não é tarefa fácil porque são muitos obstáculos. E nesse sentido é importante também mencionar o esforço da SSN em diminuir as inúmeras barreiras a essa cooperação, começando pela língua. Ter tradutores para todos aqueles que necessitavam, de forma que realmente consigam expressar o que sentem e pensam foi fundamental e simbólico. A injustiça linguística também é uma forma de poder em um mundo onde o inglês, tão disseminado e apropriado pelo Norte Global, é pouco falado nos países do Sul”, reflete Andreia Bavaresco, coordenadora-executiva do IEB.

Em um lugar marcado pelo Apartheid, mas onde as 11 línguas oficiais se cruzam pelas ruas, o impacto da opressão racial do colonizador europeu também é escancarado, mesmo que a população branca seja de apenas 8%. O peso de estar na Robben Island, ilha onde Nelson Mandela ficou preso por 18 dos 27 anos que ficou recluso, faz lembrar que lutar por justiça é sempre uma ameaça ao opressor, que está disposto aos maiores horrores para manter seu poder. Mas a força de resistência dos movimentos locais e a conexão destes com o poder da cooperação internacional com países irmãos e movimentos de libertação, tão fundamentais para a superação do projeto racista, são inspiradores para o enfrentamento à emergência climática e à ação por justiça climática, que precisa ir do local ao global. 

Afinal, os desastres decorrentes da emergência climática conectam o Sul Global. É uma pauta que tem a justiça como cerne e na qual os mais poderosos esticam a corda para não perderem seus privilégios. Não há saída para essa crise crescente, em que os grupos e pessoas historicamente mais vulnerabilizados são os mais afetados, sem uma colaboração global para transformar os espaços. Não basta ocupá-los, mas mudar o jeito como funcionam, os seus objetivos e seus princípios. E a resposta está no Sul, unido, conectado e de fato livre.

Entre as inúmeras lições de Mandela, certa vez ele disse que “a liberdade não se divide. As correntes de qualquer um dos meus homens eram as correntes em todos eles, e as correntes do meu povo eram as correntes em mim”.

Quando a mídia feminista paraguaia Revista Emancipa apresenta suas lutas por representatividade no conservadorismo local, é nossa luta também. Quando os Agents of Change da Zâmbia se mobilizam para formar comunicadores nas periferias de Lusaka, é nossa luta também. Quando a Nawaat Media, da Tunísia, relembra seus 20 anos de história questionando ditaduras, é nossa luta também. Ver a Konsepsi, da Indonésia, criando caminhos para amplificar o grito dos povos que veem suas ilhas na iminência de desaparecer, é nossa luta também. Cada uma em seu contexto, em sua realidade em sua língua, tenta transformar o mundo em um lugar mais justo. Para avançar com essa mudança, o Sul precisa estar junto e o IEB também está nessa.

Conheça os parceiros que estiveram neste encontro:

África do Sul
SouthSouthNorth(SSN)

Zâmbia
Agents of Change Foundation
Panos Institute
Zambia Institute of Independent Media Alliance (ZIIMA)

Quênia
Arid Lands Information Network (ALIN)
Pan African Media Alliance for Climate Change (PAMACC)

Tunísia
Nawaat Media
Tunisian Youth Impact
Tunisian Association for the Protection of Nature and the Environment (ATPNE Korba)
APPEDUB
Observatoire de la Souveraineté Alimentaire et de l’Environnement (OSAE)
Association Citizenship and Sustainable Development Gabes (ACDD)

Paraguay
Revista Emancipa

Bolívia
WWF-Bolívia

Indonésia
KONSEPSI/C4Ledger

Brasil
IEB

O IEB é responsável pela Gestão e Intermediação de Conhecimento e pela Comunicação na Equipe Regional do Programa Vozes pela Ação Climática Justa (VAC) no Brasil. Siga @wearevca, acesse voicesforjustclimateaction.org e leia a Revista Vozes pela Ação Climática Justa para saber mais sobre o Programa VAC e conhecer como esses movimentos e organizações do Sul Global estão atuando para enfrentar a Emergência Climática.

Texto: Adriano Maneo
Fotos: Revista Emancipa, South South North e Adriano Maneo/IEB