Formar Gestão faz mergulho de sete dias no tema de finanças para empreendimentos comunitários da Amazônia

  março 3, 2022

Análises de viabilidade econômica, fluxos de caixa, registros de contabilidade, acesso a financiamento e mercados institucionais… Apesar de fundamental, a área das finanças ainda é uma fragilidade na gestão de muitas organizações comunitárias na Amazônia. E para encarar o problema de frente, esse foi o tema do módulo “Cuidando dos Números”, o terceiro de quatro do Formar Gestão, Programa de Formação Continuada para Empreendimentos Comunitários da Amazônia.

Na última semana, 51 representantes de 20 associações ou cooperativas das cadeias de valor da castanha, açaí, pirarucu e madeira, de 6 organizações de assessoria, do ICMBio e do Serviço Florestal Americano se reuniram em Candeias do Jamari, Rondônia, para um mergulho de sete dias no complexo tema de finanças para organizações comunitárias.

“O projeto está deixando muito claro para nós qual é a melhor forma de gerir nossas organizações”, diz Laureni Barros Flores, presidente da Apadrit, associação na Resex Ituxi, em Lábrea-AM. “Para mim, a melhor parte está sendo esta, sobre finanças. Acho que o mais difícil de uma gestão é essa parte, porque às vezes a gente se perde, sim. Saber que para fazer prestação de contas tem que ter os recibos. Tem que fazer anotações e registros diários. Isso está sendo muito importante para nós”, relata.

Cursistas fazem alongamentos antes do início de mais um período de aulas. Foto: Adriano Maneo

O módulo “Cuidando dos Números” foi dividido em três temas principais:

  1. Visão interna – como registrar os números de minha organização? Como entender meu custo para definir preço? Como analisar a viabilidade de um empreendimento ou de aplicar um recurso em determinado investimento?
  2. Contabilidade – O que é, como se faz, como as informações contábeis podem nos ajudar no dia-a-dia e como elas podem ser instrumentos na luta por direitos?
  3. Financiamento e mercados institucionais – De onde podem vir os recursos para se utilizar no dia-a-dia? Quais são as políticas de acesso a crédito e de apoio à comercialização? Como eu avalio se uma oportunidade é boa para minha organização? 

 “É a primeira vez que conseguimos montar um curso com todos esses temas”, diz Fernanda Alvarenga, facilitadora do módulo e consultora técnica do Serviço Florestal Americano. “Mas antes de falar de finanças, vamos falar de contexto. Como nossa história chega aqui?”, questiona na abertura do encontro.

Fernanda Alvarenga durante uma das aulas facilitadas no Módulo 3. Foto: Adriano Maneo.

“O dinheiro é importante, necessário, mas ele não pode ser o decisório. Vocês fazem parte de um movimento que tem seus motivos que estão para além do dinheiro”, complementa.

Shirlei Arara, cursista da Terra Indígena Igarapé-Lourdes, Rondônia, segue a mesma linha e reforça que o dinheiro não precisa ser um monstro, se usado com sabedoria.

“Dinheiro pode beneficiar, mas ele também pode se tornar uma arma se você não souber como usá-lo. Se você não souber usar bem pode acabar sendo um tiro no pé. Antes de vir o valor dos objetos, tem que vir o valor nosso, do nosso chão. A maior riqueza é o nosso bem-viver. A primeira pergunta não deveria ser sobre o dinheiro, mas sobre o que é o bem-viver para nós”, disse com firmeza, para abrir o debate e as trocas.

Shirlei Arara participa de atividade em grupo no Módulo 3 do Formar Gestão. Foto: Adriano Maneo

O tema da visão interna foi o mais extenso, com facilitação da própria Fernanda Alvarenga, além da participação da equipe do IEB. Já para os temas da contabilidade e de financiamento e mercados institucionais, o IEB convidou Isaide Campelo, especialista em contabilidade de organizações comunitárias, e Gustavo Assis, consultor do MAPA e especialista em políticas de acesso a mercados para produtos da agricultura familiar e da sociobiodiversidade.

Gustavo Assis apresenta possibilidades de acesso a mercados institucionais. Foto: Adriano Maneo

Mas como de costume, nas formações do IEB o mais rico é sempre a troca de conhecimento entre os participantes. Além das muitas conversas e convivência fora da sala de aula, algumas organizações também apresentaram suas experiências exitosas em sala.

A ACJ trouxe sua experiência acessando o Programa de Aquisição de Alimentos, em Jutaí-AM; a ASPACS e a Assoab apresentaram os seus modelos de organização contábil; a AIPA apresentou o sucesso do manejo do pirarucu do povo Paumari do rio Tapauá, que recuperou a população do peixe em seu território, no sul do Amazonas, e criou uma fonte de geração de renda sustentável para a comunidade.

Os Paumari fazem parte do Coletivo do Pirarucu, que tem outros membros no Formar Gestão e que também trouxeram suas experiências.

Diomir dos Santos apresenta trabalho da ACJ e sua experiência com o Programa de Aquisição de Alimentos. Foto: Adriano Maneo

“A questão do coletivo permitiu que vendêssemos melhor nosso pirarucu. A ASPROC [associação em Carauari-AM] atua em seis áreas em manejo de lago, e compramos também a produção de outros pirarucus manejados por toda a Amazônia. Isso sobe muito o nosso preço”, contou aos colegas José Gomes, o Coquinho.

Além disso, diariamente ICMBio, FVA, OPAN, Pacto das Águas e Memorial Chico Mendes traziam a riqueza de suas experiências e perspectivas para os debates e conversas.

Ao fim do módulo, os cursistas receberam orientações para realizar atividades intermódulos de aplicação dos conhecimentos em suas organizações, e também chegou-se a possíveis datas para a realização do próximo encontro.

Cursistas fazem debates em atividades em grupo. Foto: Adriano Maneo.

O quarto e último módulo deverá acontecer em junho e tratará de comercialização.

NINGUÉM PARA TRÁS

No IEB, ninguém fica para trás. Com a migração do 3º módulo do online para o presencial, alguns cursistas não puderam participar do encontro. Assim, o IEB contratou um profissional do audiovisual para registrar todas as aulas que serão devidamente inseridas na Plataforma FORMAR, o nosso Ambiente Virtual de Aprendizagem. Assim, os participantes poderão recuperar o conteúdo, além do material servir como forma de consulta e estudo.

SEGURANÇA SANITÁRIA

Depois de dois módulos online, um sobre Organização e outro sobre Governança das organizações comunitárias, o módulo de Finanças do Formar Gestão foi presencial e teve uma série de medidas de segurança sanitária contra a Covid-19.

O resultado não poderia ser melhor. Durante os nove dias de trânsito e encontro, nenhum dos mais de 40 participantes apresentou sintomas. Os cursistas foram orientados a realizar testes até 24 horas antes do início da viagem – evitando a participação de pessoas contaminadas. No último dia da formação, o IEB ofereceu testes para todos os participantes. Todos os resultados foram negativos.

O Formar Gestão faz parte do Projeto “Promoção de Cadeias de Valor Sustentáveis e Gestão Territorial e Ambiental de Áreas Protegidas”, que é fruto da parceria entre o Governo Brasileiro e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional – USAID. O curso é coordenado pelo IEB, o Instituto Internacional de Educação do Brasil, por meio do envolvimento de um Comitê Pedagógico formado pela Operação Amazônia Nativa, Fundação Vitória Amazônica, Pacto das Águas, Memorial Chico Mendes, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, ICMBio, e Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS).