Conselho Warao Ojiduna elabora plano de ação para orientar a atuação de órgãos e instituições

  abril 23, 2024

Criado de maneira coletiva por membros do Conselho Warao Ojiduna, o documento começou a ser apresentado para autoridades durante Semana dos Povos Indígenas em Belém, no Pará

“O grande desafio que temos é sermos reconhecidos aqui no Brasil”. A afirmação é de Mariluz Mariano, indígena Warao residente em Outeiro, distrito situado em Belém (PA). A fala representa uma síntese do que orientou o Conselho Warao Ojiduna (CWO) na construção do Plano de Ação Obonoya Kotai Saba, documento que reúne uma série de demandas estruturais — de curto, médio e longo prazo — para que os Warao tenham acesso a melhores condições de vida.

Ferramenta de autogestão do Conselho para orientar suas ações dentro e fora das comunidades, o Plano também orienta o diálogo com a sociedade civil e os poderes Executivo, Legislativo e Justiça, para que os Warao sejam reconhecidos enquanto população indígena e passem a acessar direitos básicos e políticas públicas específicas de educação, saúde, trabalho e moradia.

“Nosso plano de ação foi construído entre diferentes comitês, a partir de reuniões que tínhamos para falar sobre nossas demandas. Queríamos fazer um documento mais formal para poder dar às autoridades, para que pudessem ver que o nosso plano de ação está construído a partir da nossa história. A urgência é que os nossos irmãos Warao tenham acesso a trabalho digno, assim como à educação e à saúde”, conta a jovem Warao Isneiris Nuñez, atual coordenadora do Conselho Warao Ojiduna (CWO).

Coordenadora do Conselho Warao Ojiduna, Isneiris Nuñez afirma que o Plano ajuda a organizar o movimento de incidência política dos Warao no Pará

Durante a Semana dos Povos Indígenas, realizada entre os dias 18 a 21 de abril em Belém, no Pará, o Plano de Ação foi entregue a autoridades como Joenia Wapichana, presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai); Helder Barbalho, governador do Pará; e Puyr Tembé, titular da Secretaria dos Povos Indígenas (Sepi) do Pará.

A presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Joenia Wapichana, recebe o Plano de Ação do CWO durante Semana dos Povos Indígenas, no Pará

O movimento de articulação dos Warao junto às autoridades governamentais segue durante a maior mobilização indígena do país, o Acampamento Terra Livre, que será realizado entre os dias 22 a 26 de abril em Brasília, no Distrito Federal.

Conselho Warao Ojiduna — Criado em agosto de 2022, o Conselho Warao Ojiduna é uma das primeiras organizações de indígenas refugiados no Brasil. O Conselho representa 12 comunidades de Belém, Ananindeua, Benevides e Abaetetuba, no Pará. A organização atua como um porta-voz das comunidades no diálogo com órgãos públicos e instituições que trabalham com os Warao em diferentes frentes.

Dados da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) apontam que o Brasil acolhe mais de 9,4 mil pessoas indígenas refugiadas e migrantes. Em termos numéricos, a etnia mais expressiva é a Warao (67%). Desde 2017, os indígenas Warao passaram a compor a população de comunidades tradicionais no estado do Pará, por conta do deslocamento forçado em massa dessa e de outras etnias.

A partir de 2021, lideranças Warao intensificaram ações de fortalecimento político e diálogo com o movimento indígena brasileiro, setores do indigenismo e outros movimentos sociais, por meio de ações desenvolvidas em parceria com o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), com apoio da Acnur.

Em 2022, a partir dos intercâmbios e do conhecimento de diversas formas de organização dos indígenas no Brasil, os Warao decidiram que a estrutura de um conselho seria mais adequada à sua realidade, culminando na criação do Conselho Warao Ojiduna.

Para Gardenia Cooper, Warao responsável pelo Comitê de Cultura e Esportes do CWO, o plano de ação auxilia no fortalecimento político de seu povo. “Por mais que tenhamos reuniões com alguns órgãos e que tenham algumas instituições prestando auxílio, nós, Warao, não estamos sendo bem vistos neste país. Com o Conselho aprendemos a nos organizar e a lutar pelos objetivos que queremos, já conseguimos alcançar coisas muito boas, mas ainda precisamos de saúde, trabalho e uma educação diferenciada”, compartilha Gardenia.

Josefina Cooper desempenha o papel de coordenação financeira do CWO

 Coordenadora financeira do CWO, Josefina Nuñez conta que o plano é uma ferramenta importante para que os Warao sejam incluídos nas políticas públicas brasileiras. “Queremos que o Estado reconheça o nosso plano de ação e o trabalho que estamos desenvolvendo no Conselho Warao Ojiduna. Somos 27 indígenas organizados em comitês como o de mulheres; cultura e esporte; comunicação; saúde; documentação; educação; ; jovens, trabalho e artesanato”, afirma Josefina.

“Já conseguimos algumas coisas com o Conselho, como a participação em reuniões com diferentes secretarias e ministérios. Eles nos escutaram, mas ainda não colocaram tudo em prática. Por isso continuamos na luta e informando diferentes instituições. Mas a principal vitória que conseguimos foi trabalharmos em equipe, por meio do Conselho, ainda não vimos esse tipo de organização entre os Warao de outros municípios ou estados brasileiros”, avalia Josefina.

Semana dos Povos Indígenas do Pará – Durante a programação promovida pelo governo do estado, os Warao participaram da Feira de Artes dos Povos Indígenas, com a exposição de artesanato e comidas típicas. Uma liderança Warao também participou de uma mesa de diálogos com lideranças indígenas, com a presença de representantes das etnias Xipaya, Zo’e, Xikrin, Kayapó. Na ocasião, Norberto Nuñez, Warao residente na comunidade de Levilândia, em Ananindeua, destacou a importância do intercâmbio com povos indígenas brasileiros.

Mariluz Mariano, durante Feira de Arte dos Povos Indígenas, realizada no Hangar em Belém, no Pará

“Todos somos povos originários, para os indígenas não tem fronteira, por isso estamos lutando aqui, junto com vocês, para termos direitos, estamos aprendendo também uma nova cultura, um novo conhecimento e queremos lutar com vocês, parentes e irmãos”, frisou Norberto.

Lideranças indígenas durante uma das mesas realizadas na Semana dos Povos Indígenas do Pará

Quatro mulheres Warao participaram ainda de oficinas com Maurício Duarte, estilista manaura do povo Kaixana, que resultou em um desfile de moda com peças feitas em colaboração com as indígenas e mulheres egressas do sistema prisional. Também houve uma mostra de beleza ancestral, momento em que representantes de cerca de dez etnias desfilaram com vestimentas,  que expressam a singularidade da cultura de cada  povo. Os Warao foram representados pela jovem Gardelys Cooper, que desfilou com uma roupa feita a partir da fibra do buriti, árvore da vida do povo Warao.

 

A participação dos Warao na Semana dos Povos Indígenas se encerrou na Caminhada pelo Clima em Defesa da Terra – Rumo à COP 30, realizada no dia 21 de abril, em Belém (PA).

Conselho Warao Ojiduna presente no ato de encerramento da Semana dos Povos Indígenas do Pará