Agroextrativistas colaboram com diagnóstico socioambiental da Gleba Joana Peres II

  dezembro 20, 2021

O IEB e o Ideflor-Bio realizaram quatro oficinas em diferentes pontos de Portel. O objetivo foi escutar os moradores de 41 localidades, comunidades e congregações, para identificar questões sobre a geografia, a história, a socioeconomia e a biodiversidade locais

Belém, 20 de dezembro de 2021 – Mais de 120 agroextrativistas participaram das oficinas realizadas em quatro localidades do município de Portel, no Pará, entre os dias 30 de novembro e 07 de dezembro. Desenvolvidas pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio), as atividades são parte do processo de elaboração do diagnóstico socioambiental da Gleba Joana Peres II.

Entre outros objetivos, o diagnóstico deve apoiar o ordenamento territorial e ambiental da gleba, criada em 2012 por meio de Decreto Estadual nº 579, com área de quase 236 mil hectares. De acordo com a legislação, o uso dessa área fica restrito ao manejo florestal comunitário e familiar, assim como à caça, pesca e agricultura (em áreas alteradas) de subsistência, tendo em vista a implantação de sistemas agroflorestais e agroecológicos.

Segundo o Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Portel – onde a Gleba Joana Peres II se encontra – é o oitavo entre os 772 municípios que, em toda a Amazônia Legal, apresentaram as maiores áreas de florestas destruídas nos últimos três anos, em correlação com baixíssimos indicadores socioambientais. O município também está entre os dez com maior desmatamento detectado entre os anos de 2018 e 2021.

Grandes faixas de florestas se encontram em mais de 90% da Gleba Joana Peres II, mas sofrem pressões de frentes madeireiras e do agronegócio, segundo relatos de lideranças comunitárias locais. Com o ordenamento territorial e ambiental da área, a expectativa é que o processo de regularização fundiária seja consolidado pelo governo do Pará.

Para o sindicato, [a regularização fundiária] é de suma importância porque Portel está sendo muito invadida. Pelo Alto Anapu e Alto Pacajá já não tem mais floresta, essa é uma área de contenção para o desmatamento não chegar mais para próximo”, afirma Odivan Corrêa, que é presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Portel e da Associação dos Moradores Agroextrativistas do Assentamento Acutipereira (ASMOGA).

Com a regularização, se Deus quiser, da Joana Peres II, fecha uma área de amortecimento. A gente está sendo muito atacado pelo pessoal do agronegócio, da soja, alguns políticos, então para nós a importância é muito grande de se ter a Joana Peres II, que é a contenção do desmatamento”, defende.

Foram mais de 120 participantes nas oficinas realizadas em quatro polos distintos da Gleba Joana Peres II

Oficinas – As oficinas foram realizadas em quatro locais distintos – Santo Antônio do Brabo, São Sebastião, Vila Bacuri e São José do Aru -, que serviram de polos para 17 localidades e 24 comunidades (de base católica) e congregações (de base evangélica), situadas ao longo dos Rios Anapu e Pacajá.

Participaram da comitiva de organizadores representantes do IEB, do Ideflor-Bio, do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Portel e da Associação de Moradores Agroextrativistas da Gleba Joana Peres II, Rio Pacajá (AMAGJOPP).

As dinâmicas envolveram a construção de mapas colaborativos e consultas sobre a etnobiologia, a socioeconomia e a história de ocupação local.

Além disso, os participantes discutiram sobre os limites e potencialidades para o desenvolvimento sustentável no território em que vivem, tendo como referência os usos que fazem dos espaços e os recursos naturais neles disponíveis.

A programação de viagem à gleba Joana Peres II foi fundamental para chegar até as pessoas que habitam o território e que desejam ter suas áreas protegidas. Para além de levar uma esperança, [esse tipo de iniciativa] fortalece a organização para o uso sustentável dos recursos”, explica Rosiane Pantoja, técnica em gestão de Desenvolvimento Agrário e Fundiário do Iterpa.

O Iterpa é um órgão responsável pela regularização fundiária e ordenamento rural, portanto a destinação das terras públicas às famílias agroextrativistas tem como função garantir a sua manutenção, proteger as futuras gerações e preservar o meio ambiente”, prossegue. “Nesse sentido, o Diagnóstico Rápido Participativo, além de levantar a situação da área, também contribuiu para identificar os impasses e as perspectivas social e ambiental, ajudando a encontrar soluções para as questões de preservação ambiental”.

As informações levantadas e verificadas em campo estão sendo sistematizadas por meio da colaboração entre analistas do IEB, do Ideflor-Bio e do Iterpa. O documento final será apresentado em um novo seminário, a ser realizado em Portel como parte do processo de validação e transparência de todo o trabalho desenvolvido pelas instituições responsáveis pelo diagnóstico.

Essas ações reafirmam o compromisso do IEB com as populações agroextrativistas de Portel. Os indicativos do campo evidenciam o uso múltiplo que as famílias que vivem na Gleba Joana Peres II têm feito das florestas, águas e terras e o quanto é necessário garantir sua permanência neste território, com qualidade de vida”, afirma Daltro Paiva, analista socioambiental do IEB.

Saberes sobre a etnobiologia, a socioeconomia e a história de ocupação local foram apresentados pelos participantes durante as oficinas

Gleba Joana Peres II – A Gleba Joana Peres II limita-se a oeste e norte pelo rio Anapu, a leste pelo rio Pacajá e a sul pelo limite jurisdicional do próprio estado do Pará.

Dos cerca de 236 mil hectares compreendidos pela gleba, quase 95% correspondem a florestas, com boa parte delas manejadas de forma comunitária por famílias  agroextrativistas, que vivem ao longo dos cursos dos rios e igarapés, predominantemente nas faixas de várzea.

O extrativismo comunitário da madeira e do açaí, a produção de mandioca e de hortifruti, junto com a coleta de óleos e plantas medicinais, a pesca e a criação de animais de pequeno porte para o consumo familiar, estão entre as principais atividades realizadas no interior no território coletivo.

As oficinas tiveram como objetivo o mapeamento dos territórios de uso das comunidades, assim como a ocupação e a cobertura do solo nessas áreas, que incluem florestas, campos naturais, áreas alteradas como capoeiras e atividades agrícolas. Também coletamos algumas informações geográficas importantes, a exemplo da localização dos rios, igarapés, lagos e seus nomes, assim como informações sobre estradas, principalmente de exploração de madeira ilegal e a própria localização dessas extrações de madeira ilegal”, conta o técnico em gestão ambiental do Ideflor-Bio, Daniel Francez.

Segundo ele, a consulta às comunidades também permitiu reconhecer uma nova área prioritária para a conservação. “Foi praticamente consensual nas quatro oficinas a necessidade de proteger essa área de campos, que é sensível do ponto de vista ambiental, por representar uma região de nascentes da maioria dos rios e igarapés importantes desse território, além de ser um berçário natural tanto de peixes quanto de aves e também de incidência de quelônios”.

Além disso, o grupo constatou que a área é usada por grande parte da fauna silvestre para a alimentação e reprodução. “Por essa razão, a gente sugeriu a criação de um refúgio da vida silvestre, que é uma modalidade de unidade de conservação de proteção integral”, adianta o especialista.

Texto: Brenda Taketa

Imagens: Divulgação IEB