Roda de Beleza Natural: A Sabedoria Ancestral das Mulheres e o Potencial das Plantas do Cerrado

Processo formativo promove Roda de Beleza Natural entre cursistas e levanta discussão sobre papéis de gênero e o potencial da flora cerratense

Você já parou para pensar como uma simples roda de beleza feita por mulheres pode abrigar debates fundamentais para a sociedade? Engana-se quem pensa que o momento do autocuidado se limita ao embelezamento da pele e dos cabelos. Ele pode ir além, transformando-se em um ato político, uma celebração cultural, uma expressão de força e resistência, onde temas como autoestima, papéis de gênero, geração de renda e desafios enfrentados pelas mulheres dentro e fora de casa são discutidos e acolhidos.

Isso ficou evidente no primeiro módulo do Formar Baru, a Formação Continuada em Cadeias de Valor Inclusivas do Cerrado, realizado pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) com o apoio do Fundo Global para o Meio Ambiente (gef) e do FUNBIO. Este programa visa não apenas fortalecer o baru, uma castanha nativa do Cerrado, como elemento-chave para a conservação socioambiental e a geração de renda nas comunidades tradicionais do bioma, mas também criar espaços de conscientização de gênero.

Roda de Beleza: O Tesouro Oculto do Cerrado

No dia 26 de abril, dia de lua cheia no Cerrado, mulheres kalunga, extrativistas, agricultoras familiares e baruzeiras se reuniram para uma Roda de Beleza Natural, marcando o encerramento do 1º Módulo do Formar Baru. Em um momento dedicado à troca de experiências, utilizando ingredientes da sociobiodiversidade cerratense, as participantes compartilharam saberes sobre as propriedades medicinais e estéticas das plantas e frutos da região.

Veja abaixo um pequeno vídeo da Roda de Beleza:

Para a limpeza de pele, foi utilizado o Gel de Tingui. Para cachos brilhantes e radiantes, o óleo de Baru e Buriti. E para tratar acne, cicatrizes, desconfortos ginecológicos e flacidez, Barbatimão, Mutamba e Alecrim. Enquanto para algumas participantes era uma surpresa descobrir que aquelas plantas do quintal possuíam tantas propriedades medicinais, para outras, eram segredos de beleza ancestrais passados de mãe para filha há muitas gerações.

Foto 1: Camila Almeida, convidada da roda de beleza, compartilha ingredientes do Cerrado para cuidados com a pele e cabelo.

Em união com a Roda de Beleza, o Formar Baru incluiu atividades chamadas “Pílulas de Gênero”, conduzidas por Bianca Lima, coordenadora do Programa Povos do Cerrado do IEB. Essas atividades se revelaram um terreno fértil para discussões sobre temas como os papéis atribuídos às mulheres em suas casas, comunidades e trabalhos, a discriminação de gênero e os desafios encontrados por cada uma delas em seus cotidianos.

Em muitas comunidades rurais do Cerrado, as mulheres desempenham um papel central na preservação das tradições culturais de seus povos. Além das responsabilidades socialmente atribuídas (como maternidade e cuidados domésticos), elas também lidam com a colheita, o transporte, o beneficiamento da castanha-de-baru, assim como a negociação com intermediários e participação de feiras. Essas múltiplas responsabilidades não só exigem um esforço físico e emocional significativo, mas também consomem grande parte do seu tempo, tornando praticamente impossível a realização de simples rituais de autocuidado, descanso e lazer.

Sendo assim, a Roda de Beleza e as Pílulas de Gênero proporcionaram um espaço seguro de solidariedade e apoio mútuo, focado na escuta, na troca de experiências e no autocuidado físico, emocional e mental dessas mulheres.

Foto 2: Cursistas se reúnem para participar da Roda de Beleza.

Explorando o Potencial Terapêutico e Econômico da Biodiversidade do Cerrado

Além das discussões de gênero e de agregação de valor aos produtos do Cerrado, a Roda de Beleza promoveu conexões entre os produtores e o setor privado. Juntamente com Bianca Lima (IEB), a Roda de Beleza foi conduzida por nossa convidada, Camila Almeida, mãe, empreendedora e fundadora da Elementais do Cerrado. Desde 2013, Camila vive em Alto Paraíso (GO) e produz cosméticos naturais usando ingredientes do bioma, extraídos e beneficiados por ela e sua equipe.

Camila compartilhou seus conhecimentos sobre a extração dos princípios terapêuticos das plantas, evidenciando o potencial comercial da flora do Cerrado. Ela destacou que o óleo vegetal de baru é incomparável para cuidados com a pele e cabelos, superando até mesmo o famoso (e caro) óleo de argan. No entanto, também mencionou a dificuldade em extrair ou adquirir o óleo prensado a frio, pois nem ela, nem os baruzeiros da região possuem as máquinas adequadas para essa extração, que preserva os nutrientes do óleo.

Rosana, conhecida como Preta, uma das lideranças do Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (CEPPEC) no Mato Grosso do Sul, e uma das participantes do projeto Formar Baru, destacou:

“Antes, coletávamos o baru apenas para matar a fome, mas depois descobrimos que ele tinha muitos outros benefícios e que poderíamos fazer muitas coisas boas a partir dele. Hoje, já há pessoas procurando o baru até para exportação. Temos mais de 90 famílias envolvidas no processo da cadeia socioprodutiva do baru. Ele gera renda e empregabilidade. Agora nós precisamos fortalecer esse movimento com responsabilidade e construir juntos uma cadeia de valor justa para o baru e para os/as baruzeiros/as.”

Foto 3: Mulheres seguram frutos de baru durante o evento.

Encerrando em clima de irmandade e celebração, a Roda de Beleza e o 1º Módulo do Curso Formar Baru se revelaram como poderosas sementes de transformação no bioma Cerrado. Ao valorizar a sociobiodiversidade local, os povos tradicionais e o papel das mulheres nas comunidades rurais, essas iniciativas não apenas promovem a sustentabilidade da cadeia produtiva do baru, mas também criam espaços dedicados à conscientização de gênero, apoio e fortalecimento feminino. 

Para mais informações sobre o Formar Baru, clique aqui

Formar Baru

O Formar Baru é um programa de formação continuada desenvolvido pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), como parte do projeto  “Cerrado em pé com geração de renda: a cadeia produtiva do baru como aliada da biodiversidade e dos povos tradicionais”, conhecido também como Baru da Chapada. Seu objetivo é promover a conservação ambiental e a geração de renda no Cerrado através da castanha-do-baru, estruturada como um programa de formação continuada em seis módulos presenciais, intercalados com atividades intermodulares denominadas “tempo-comunidade”.

O projeto é realizado em parceria com a Associação Quilombo Kalunga (AQK) e a Cooperativa Agroecológica dos Produtores Rurais do Município de Alto Paraíso de Goiás e Região Ltda. (CooperFrutos do Paraíso), com o apoio do Global Environment Facility (GEF) e do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), e conta com a participação do ISPN, Embrapa Cenargen e Central do Cerrado em seu comitê pedagógico.

Foto 4: Turma completa do Formar Baru reunida para a foto final.


Texto: Camila Behrens / Vídeo: Camila Behrens 

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