Produtores, extrativistas, quilombolas e assentados se encontram no 1º Módulo do Formar Baru, promovido pelo IEB

Formação é parte do projeto “Cerrado em pé com geração de renda: a cadeia produtiva do baru como aliada da biodiversidade e dos povos tradicionais”

Você provavelmente já ouviu falar da castanha-da-amazônia, também conhecida como castanha-do-pará. Mas você sabia que o solo do Cerrado também produz uma saborosa e valiosa castanha? E que além de ser uma poderosa fonte de nutrientes, ela também é uma importante fonte de renda para muitas famílias, além de representar uma alternativa viável para a recuperação de áreas degradadas? Essa é a castanha-do-baru, uma das grandes estrelas da Formação Continuada em Cadeias de Valor Inclusivas do Cerrado, o Formar Baru, que teve seu primeiro módulo realizado em Brasília dos dias 22 a 26 de abril.

Realizado pelo IEB em parceria com a Associação Quilombo Kalunga (AQK) e a CooperFrutos de Alto Paraíso, o evento contou com a participação de extrativistas, quilombolas, agricultores, pesquisadores, servidores públicos e parceiros da região da Chapada dos Veadeiros, com o objetivo de fortalecer a castanha-do-baru como um elemento-chave para a conservação socioambiental e a geração de renda nas comunidades tradicionais do Cerrado.

O programa, com duração de dois anos, está sendo realizado com o apoio do Global Environment Facility (GEF) e do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), contando com representantes do ISPN, Embrapa Cenargen e Central do Cerrado em seu comitê pedagógico.

Com participantes vindos de diferentes regiões de Goiás, como Alto Paraíso, Monte Alegre, Cavalcante, Teresina de Goiás, além de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, a semana de evento começou em clima de alegria, celebração e curiosidade. Afinal, seria a primeira vez que os cursistas se encontrariam pessoalmente para iniciar a formação.

Foto: © IEB
Cursistas compartilham momentos de diversão ao oferecerem castanhas-de-baru e lascas de buriti para seus colegas de formação.

A abertura do evento contou com uma dinâmica em que cada participante teve a chance de se apresentar, compartilhar um pouco de sua história com o bioma Cerrado, e marcar em um grande mapa onde se localizava seu território, contando suas expectativas e aspirações para a jornada que estava só começando.

Apresentação dos participantes e mapeamento geográfico de seus territórios.

Carlos Pereira, presidente da Associação Quilombo Kalunga, compartilhou em sua apresentação que

“antes de cada um de nós estar aqui, pisando nesse chão, houve alguém. Devemos honrar a luta dos nossos antepassados que conquistaram esse direito para nós. Para que o baru esteja aqui na mesa, houve uma semente que nasceu, brotou, virou árvore e deu frutos. Assim somos nós também. Vamos honrar nossos antepassados e vamos plantar frutos juntos para que o Cerrado e nosso futuro sejam abundantes.”

Carlos Pereira, presidente da Associação Quilombo Kalunga, durante discurso na mesa de abertura do evento.

Rosa Lemos, Diretora do FUNBIO, também compartilhou a sua história:

“A primeira vez que pisei no Cerrado, em 1993, me apaixonei por essa terra. Um bioma lindo, rico em biodiversidade, povos e cultura, e fundamental para a questão hídrica do Brasil. Além de sua riqueza natural, o Cerrado é de enorme importância para o resto do país. Trabalhar pelo fortalecimento das populações tradicionais não só melhora o desenvolvimento da região, mas também contribui para o país como um todo. Investir no fortalecimento das comunidades tradicionais e de suas lideranças é um enorme prazer e uma luta indispensável.“

Foto: © IEB

E com essa energia foi dada a largada em nossa longa semana de trabalho e luta coletiva.

 

Formação Continuada: Ampliando Horizontes e Fortalecendo Elos

O Formar Baru é um projeto desenvolvido pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), inserido no âmbito do projeto “Cerrado em pé com geração de renda: a cadeia produtiva do baru como aliada da biodiversidade e dos povos tradicionais”. Com o objetivo de promover a conservação e a geração de renda no Cerrado por meio da castanha-do-baru, ele é estruturado como um programa de formação continuada, dividido em seis módulos presenciais, intercalados com atividades intermodulares chamadas de “tempo comunidade”.

Durante esses seis módulos, os participantes do programa recebem apoio, participam de oficinas, têm acesso a materiais didáticos e são acompanhados pedagogicamente em diversos aspectos relacionados à cadeia produtiva do baru. Isso inclui desde o manejo sustentável, até estratégias de comercialização, modelos de desenvolvimento, economias locais e regionais, gestão de negócios comunitários e repartição de benefícios econômicos.

Priorizando sempre o respeito e a valorização dos saberes tradicionais das comunidades do Cerrado, a proposta pedagógica e os eixos temáticos da formação foram elaborados de forma colaborativa. Nesse sentido, a etapa de Modelagem do processo formativo foi fundamental para assegurar que o programa atendesse não somente aos pilares do projeto, mas principalmente às reais demandas e necessidades das comunidades envolvidas. Clique aqui para saber mais sobre a etapa de modelagem da formação, que ocorreu em abril de 2024.

Integrantes do Comitê Pedagógico da etapa de Modelagem do Formar Baru em atividade, em abril de 2024.

Dentro dessa metodologia, cada cursista desempenha o papel tanto de estudante quanto de educador, e contribui ativamente com a construção dos conhecimentos, dos materiais e das discussões levantadas ao longo do curso.

Como apontado por Maria José, presidente do IEB,

“o Formar é uma metodologia de troca e aprendizado mútuo. Nós aprendemos, vocês aprendem, nós ensinamos e vocês também ensinam. E é assim que juntos, nós construímos conhecimento e fortalecemos nossas comunidades.”

No primeiro módulo do Formar Baru, que teve como tema “Introdução às Cadeias Produtivas Sustentáveis do Cerrado e seus Povos”, os participantes embarcaram em uma jornada de aprendizado e troca de experiências. Durante essa etapa, exploraram diversas questões essenciais para compreender a importância e os desafios da cadeia de valor do baru.

A programação foi diversificada e incluiu momentos de reflexão sobre as histórias de uso e ocupação do Cerrado, compartilhadas por suas lideranças. Modelos de desenvolvimento e economias locais também foram discutidos, abrindo caminho para entender os conceitos fundamentais das cadeias de valor e as oportunidades e desafios da produção agroextrativista.

Reunião de debate dos cursistas da Associação Quilombo Kalunga para discutir conceitos de cadeias de valor.

Um destaque especial foi dado aos “Caminhos do Baru”, desde sua origem no Cerrado até sua chegada à mesa dos consumidores. Rosana, cursista do projeto e mais conhecida no mundo do baru como Preta, apontou ao longo das discussões que

“antes, coletávamos o baru apenas para matar a fome, mas depois descobrimos que ele tinha muitos outros benefícios e que poderíamos fazer muitas coisas boas a partir dele. Hoje em dia, já há pessoas procurando o baru até para exportação. Temos mais de 90 famílias envolvidas no processo da cadeia socioprodutiva do baru. Ele gera renda e empregabilidade. Agora nós precisamos fortalecer esse movimento com responsabilidade, e construir juntos uma cadeia de valor justa para o baru e os baruzeiros.”

Além disso, foram apresentados casos de sucesso na cadeia do baru, inspirando os participantes com exemplos concretos de como é possível alcançar resultados positivos.

Apresentação da atividade prática ‘Caminhos do Baru: do Cerrado à Barriga’.

Além das atividades direcionadas à cadeia produtiva, o módulo também proporcionou momentos de autocuidado, com uma “Roda de Beleza Natural”, e explorou a riqueza gastronômica do baru em uma oficina dedicada à culinária. Essas atividades ressaltaram, significativamente, as inúmeras riquezas e possibilidades de empreendimento e práticas que o bioma Cerrado pode oferecer. Além de agregar valor aos produtos do Cerrado, ainda promoveu conexões entre os produtores e o setor privado.

A programação também incluiu a participação no 20º Acampamento Terra Livre (ATL), uma oportunidade única para os participantes se envolverem com as questões indígenas e fortalecerem suas conexões com diferentes comunidades e movimentos sociais. Além disso, houve momentos de celebração com uma “Roda de Apresentação Musical e Cultural”, onde os participantes puderam dançar, cantar e compartilhar suas expressões artísticas e culturais.

Apresentação musical durante o evento.

Para complementar o aprendizado, foram oferecidas “Pílulas de Gênero e Pílulas de Legislação”, abordando questões importantes relacionadas à igualdade de gênero e à legislação ambiental e social.

Próximos Passos: Tempo-Comunidade e Ação Local

Agora, após o primeiro módulo, os participantes iniciam a etapa do “Tempo-Comunidade”, onde colocarão em prática os conhecimentos adquiridos, e desenvolverão pesquisas e atividades em seus territórios, com orientações e acompanhamento pedagógico através da Plataforma Formar. O objetivo é que se tornem multiplicadores de conhecimento e promovam transformações positivas em suas comunidades.

Para acompanhar as próximas edições do “Formar Baru” e saber mais sobre as ações realizadas, basta acessar o site e as redes sociais do IEB. A cobertura será fornecida, mantendo todos informados sobre os avanços e impactos desse importante programa de formação para o desenvolvimento sustentável do Cerrado.

Del,  professora da Escola do Sertão, agricultora extrativista e pesquisadora cerratense, expressou sua gratidão e compromisso com a jornada:

“Sou cerratense de alma, corpo e coração. Vivo nessa luta diária que muitas vezes parece ser como matar um leão por dia. Luto por aquele que não pode falar: o nosso Cerrado. Não somos apenas o povo do Cerrado, somos o povo das águas, e da vida. Algumas pessoas pensam que o povo das águas é apenas aquele que vive à beira-mar. Mas não! Nós também somos o povo das águas, pois vivemos sobre as nascentes e o berço dos rios, que fluem em direção aos rios, ao mar e ao céu. Estou feliz por estar aqui com todos vocês, guardiões da vida. Desejo que continuemos firmes e fortes, superando todos os obstáculos. Unidos pelo baru e pelo Cerrado.”

Texto: Camila Behrens

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