Dia Mundial do Refugiado: Conselho Warao Ojiduna lança seu Plano de Ação

Dividido em nove eixos temáticos, o documento reúne as principais demandas das comunidades Warao da Região Metropolitana de Belém

Celebrando sua cultura e identidade, de mãos dadas, cantando e dançando em círculo. Foi desta forma que o Conselho Warao Ojiduna iniciou a programação do lançamento oficial de seu Plano de Ação, realizado no último dia 18, em alusão ao Dia Mundial do Refugiado, comemorado neste 20 de junho.

Criado pelos Warao com o objetivo de apoiar a luta pelo reconhecimento da etnia enquanto população indígena no Brasil, o Plano de Ação reúne as principais demandas das comunidades Warao da Região Metropolitana de Belém, divididas em nove eixos temáticos: reconhecimento e fortalecimento político; saúde; educação; cultura; terra e moradia; mulheres; jovens; comunicação e documentação.

O documento é considerado um dos frutos do processo de fortalecimento dos Warao, impulsionado pelo projeto “Povos das Águas: Waraotuma Kokotuka Saba”, implementado pelo Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), com o apoio da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) e demais parceiros.

A mesa de abertura foi dividida em três blocos, composta por representantes de diversas instituições que desenvolvem trabalhos com os Warao, a exemplo do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA); Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE); Federação dos Povos Indígenas do Pará (Fepipa); Acnur; Secretaria de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda do Pará (Seaster); Secretaria Municipal de Educação (Semec) de Belém; Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai); Fundação Papa João XXIII (Funpapa); Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos (SECDH); Cáritas Brasileira – Regional Norte II; Comissão da Defesa de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Belém (CDH/CMB); IEB e do próprio Conselho Warao Ojiduna.

Representante da Fepipa, Ronaldo Anamayé frisou a importância de se referir aos Warao como povo indígena, e não como migrante, destacando a união como estratégia de fortalecimento. “O Plano fala muito de união das comunidades, é assim que a gente vai resistir, com união, estratégia e sabedoria. Nós estamos juntos na luta, não é fácil, temos muitas resistência, mas nós vamos conseguir alcançar nossos objetivos”, afirmou.

Miguel Pachioni, do Acnur, falou sobre a importância de uma articulação interinstitucional para potencializar a luta Warao . “Esse Plano não se concretiza nesse ato, ele tem que circular, é preciso que seja levado adiante para que as políticas públicas estejam contempladas [com as demandas]”. Após as falas de abertura, a programação seguiu com a mesa “A importância das ferramentas de autogestão de povos indígenas em deslocamento forçado”, com a participação de representantes da Funai, do MPPA, do IEB e do Conselho Warao Ojiduna.

Promotor do MPPA, Raimundo Moraes falou sobre recursos de poder, destacando os movimentos de incidência dos Warao. “Esse plano é resultado dessa capacidade de organização [de vocês], uma orientação intelectual, sentimental, vital, que passa para o espaço público. Para sairmos de uma situação indesejada, é necessário que nós conheçamos bem a realidade e vocês trouxeram a história da vida de vocês na Venezuela, vocês estão construindo a história aqui. Sem todos esses passos que vocês já deram antes, nós, do MPPA, não teríamos elementos base para ajudá-los a conquistar direitos”, disse Moraes.

Raimundo Moraes durante sua fala na mesa sobre ferramentas de autogestão

Chefe da Coordenação Técnica Local da Funai em Belém, André Pantoja falou sobre a formalização do Grupo de Trabalho para a atualização do Plano de Ação com diretrizes para o atendimento dos indígenas Warao. Segundo Pantoja, o plano deve refletir as especificidades dos Warao na RMB. “A Funai, historicamente, se fundamentou em um trabalho com indígenas aldeados, mas a gente tem hoje uma realidade que reflete uma forte presença de indígenas na cidade. Em Belém, há a necessidade de lidar com essas novas realidades. A partir de agosto, vamos realizar um trabalho de visita às famílias Warao, para colher informações e qualificar bem a demanda para garantir o melhor atendimento possível”, informou Pantoja.

Do IEB, a antropóloga Clémentine Maréchal destacou o processo de reterritorialização dos Warao, marcado por uma forte relação com a natureza. “Quando os Warao afirmam, no seu Plano de Ação, que precisam conhecer melhor o território, a exemplo de Outeiro, para poder pescar, ou retirar a palma de buriti, não estamos falando apenas de uma relação focada na geração de renda, uma relação utilitarista da terra e das águas, estamos falando na reelaboração de práticas tradicionais e culturais que abarcam o fortalecimento das relações sociais articulada com a afirmação cultural, com o fortalecimento da saúde, com a possibilidade de reprodução econômica dos grupos e que são atravessados por dimensões cosmológicas nas relações que vão se reconstruindo”, analisou.

A programação foi encerrada com uma mesa para apresentação do Plano de Ação, composta por Isneiris Nuñez, Freddy Cardona, Josefina Jimenez, Israel Garcia e Argélia Garcia, alguns dos integrantes do Conselho Warao Ojiduna.

 


Mesa de apresentação do Plano de Ação do Conselho Warao Ojiduna


Freddy Cardona destacou a história de luta do povo Warao em Belém e o momento de criação do Conselho Warao Ojiduna. Isneiris Nuñez apresentou a estrutura do Conselho, abordando a importância dos Warao terem uma organização própria, enquanto Israel Garcia destacou os principais eixos e atividades do Plano, chamando a atenção das instituições presentes para apoio na implementação.

Coordenadora financeira do Conselho, Josefina Jimenez contou sobre o processo de construção do Plano, resultado de um trabalho iniciado antes mesmo da criação do Conselho. “Construímos isso porque conseguimos conversar entre as diferentes comunidades para pensar sobre o que queríamos aqui, no Brasil, enquanto povo indígena que somos. Quando formamos o Conselho, pensamos bastante sobre o que queríamos e o que deveríamos fazer. Fizemos diversas reuniões e oficinas com nossos parceiros e criamos grupos para definir as nossas prioridades”, relatou.

“Para nós, é uma honra ter este documento e compartilhar com vocês, é um documento que guia as nossas ações como coletivo e como povo, que hoje se reconstrói aqui na Região Metropolitana de Belém, mas também em todos os estados do Brasil”, finalizou Josefina.

Dia Mundial do Refugiado – Data internacional designada pelas Nações Unidas para homenagear as pessoas refugiadas em todo o mundo, o Dia Mundial do Refugiado é comemorado em 20 de junho e celebra a força e a coragem das pessoas que foram forçadas a deixar seu país de origem em razão de conflitos ou perseguições.

De acordo com o Painel de Informações sobre Populações Indígenas, lançado trimestralmente pelo Acnur em parceria com o Ministério dos Povos Indígenas e Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, estima-se que há mais de 11 mil indígenas refugiados ou com necessidade de proteção internacional vivendo no Brasil. A maioria é da etnia Warao, com mais de 7,5 mil pessoas. Desde 2017, os indígenas Warao passaram a compor a população indígena no estado do Pará, por conta do deslocamento forçado em massa da Venezuela.

Durante a semana, o Conselho Warao Ojiduna marca presença em outras programações alusivas ao Dia Mundial do Refugiado. No dia 19 de junho, representantes do Conselho estiveram presentes na votação que aprovou a resolução para educação de indígenas imigrantes e refugiados, promovida pelo Conselho Municipal de Educação. A resolução estabelece, junto às instituições de educação básica do Sistema Municipal de Educação de Belém, diretrizes para o atendimento de estudantes indígenas, migrantes, refugiados, apátridas e solicitantes de refúgio. O Conselho Warao Ojiduna e o IEB foram algumas das instituições que contribuíram para o texto.

No dia 21 de junho, às 16h, o Conselho participa do painel “Fortalecimento das capacidades de comunidades deslocadas para prevenção, mitigação, preparação e resposta aos impactos das mudanças climáticas”, ação que integra a programação do seminário “Mudanças climáticas, Deslocamento e Direitos Humanos: contribuições à elaboração de políticas públicas”, promovido pelo Acnur, no Palácio Antônio Lemos. 

Conselho Warao Ojiduna — Considerado uma das primeiras organizações de indígenas refugiados no Brasil, o Conselho Warao Ojiduna foi criado em agosto de 2022, a partir de uma assembleia que reuniu mais de 75 indígenas Warao da Região Metropolitana de Belém. 

O Conselho reúne cerca de 30 conselheiras e conselheiros que representam 12 comunidades e cerca de 800 indígenas Warao situados em Belém, Ananindeua, Benevides e Abaetetuba, no Pará. A organização atua como um porta-voz das comunidades no diálogo com órgãos públicos e instituições que trabalham com os indígenas Warao em diferentes frentes.

IEB – O Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) é uma associação brasileira sem fins lucrativos dedicada à formação e fortalecimento de capacidades de pessoas, bem como ao fortalecimento de organizações comunitárias nas áreas de manejo dos recursos naturais, gestão ambiental e territorial e outros temas relacionados à sustentabilidade. Desde 2021, o IEB desenvolve ações voltadas ao fortalecimento comunitário e à atuação dos indígenas Warao na incidência política pela garantia de direitos. 

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