Em meio à pandemia, etapa virtual do curso de Gênero e Identidades Negras no Amapá termina

  agosto 28, 2020

Luana Luizy- assessora de comunicação IEB

“Aprendi que nós, mulheres quilombolas, temos que lutar pelo nosso direito à educação de qualidade e jamais nos calarmos diante das situações de racismo e de violência”, diz Luzia Silva- do território quilombola, Conceição do Maracá (AP)- sobre como tem sido sua experiência, no curso de Gênero e Identidades Negras no Amapá, cuja etapa virtual se encerrou no dia (27).

A realidade da educação para mulheres negras nunca foi prioridade pelo Estado brasileiro, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, que apresentam os piores indicadores sociais quanto à formação e acesso à educação no País, fator que expressa uma negligência histórica com esse grupo.

“O analfabetismo é a expressão mais aguda da negação do direito à educação, o quadro nacional é extremamente desafiador especialmente nas regiões Nordeste e o Norte, que ficaram com os maiores percentuais de pessoas analfabetas: 13% e 8,0%, respectivamente”, afirma Maura Moraes, coordenadora de projetos do IEB.

Diante desse cenário de desigualdade, a iniciativa de realizar uma formação sobre  Gênero e Identidades Negras surgiu como um meio de enfrentar essa dura realidade, resultado de um esforço do IEB, apoiado pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil, com financiamento da União Europeia, para promover uma educação diferenciada às mulheres negras e quilombolas, nos municípios de: Itaubal, Mazagão, Laranjal do Jari e Vitória do Jari, no estado do Amapá.

Conforme aponta o IBGE¹ (2019), a escolaridade da população negra em comparação a branca ainda apresenta forte desvantagem. Entre 2016 e 2018, enquanto a taxa de analfabetismo das pessoas negras era de 9%, a da população branca era de 3,9%. O cenário de analfabetismo se acentua ainda mais ao analisarmos a população que mora na zona rural, que enfrenta maiores dificuldades no acesso educacional.

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O racismo estrutural na sociedade brasileira se configura ao não propiciar as mesmas condições de educação para todos os setores da população, as assimetrias por cor/raça e região persistem. Ainda, segundo o IBGE (2019), a taxa de conclusão do ensino médio por mulheres negras foi apenas de 67% e de mulheres brancas, 81%.

Dessa forma, ações que modifiquem essa realidade são necessárias num País onde a educação pública, de qualidade e  gratuita está muito aquém de ser uma realidade. O direito à educação inclusiva e equitativa é um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) do Brasil rumo à Agenda 2030- que propõe  um conjunto de plano de metas da sociedade civil para erradicar a pobreza, pactuada pelo Brasil e outros 192 países que integram a Organização das Nações Unidas (ONU).

 

OBSTÁCULOS

Embora educação seja um direito humano básico universal e um dever constitucional do Estado brasileiro, as barreiras para o acesso enfrentadas por algumas das educandas são inúmeras: desde falta de bibliotecas, livros básicos, restrições do acesso à internet e outras formas de tecnologia. Há mulheres que só podem acessar o conteúdo programático à noite, quando o motor diesel que gera energia é ligado.

Luziani Rosa, da comunidade Tapereira, no município de Vitória do Jari, conta que só veio aprender a trabalhar com tecnologia por meio do curso: “Eu moro muito longe da cidade, com o curso criei o whatsaap para poder participar. Essa formação tem sido muito importante para mim”, afirma.

Nesse sentido, a formação de Gênero e Identidades Negras objetiva  colaborar com uma agenda para a garantia e acesso ao direito à educação escolar de qualidade social e técnica, em consonância com os objetivos da Agenda 2030, na perspectiva dos ODS 4 (Educação) e ODS 5 (Igualdade de Gênero). “Nós não temos visibilidade na sociedade, acabei percebendo a minha realidade,  por meio do curso, na falta de garantia de direitos”, expressa Mariele Moraes, da comunidade quilombola Nossa Senhora do Destino Dois Irmãos.

 

¹IBGE. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. (2019) Disponível em:

< https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf>