Vitória Indígena! STF confirma liminar obrigando governo Bolsonaro a combater Covid-19 entre povos indígenas

  agosto 5, 2020
Decisão é considerada nova vitória dos povos indígenas. Liminar de Roberto Barroso foi acatada de forma unânime

 

Reportagem e edição: Oswaldo Braga de Souza (Instituto Socioambiental)

O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou integralmente a liminar do ministro Luís Roberto Barroso, do início de julho, que obrigou o governo Bolsonaro a tomar medidas emergenciais para combater a pandemia entre os povos indígenas (saiba mais no quadro ao final da reportagem). Todos os ministros votaram a favor e nem mesmo a Advocacia-Geral da União (AGU), que representa a administração federal, contestou a decisão. A Procuradoria-Geral da República (PGR) fez o mesmo.

O julgamento começou na segunda (3) mas foi suspenso e sua conclusão foi transferida para hoje (5). Os ministros ainda deverão analisar o mérito da ação, mas não há data marcada para isso acontecer. O novo julgamento abre espaço para que novas medidas sejam tomadas pelo tribunal, caso o governo não aja.

“Não é exagero alertar esta corte de que temos, sim, um risco de genocídio. Temos povos isolados que, se forem contaminados, um grupo inteiro pode ser exterminado”, denunciou Luiz Eloy Terena, advogado da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), responsável pela ação original.

A advogada do ISA Juliana de Paula Batista falou na sessão na qualidade amicus curiae (“amiga da causa”) e reforçou a associação entre invasões às Terras Indígenas (TIs) e a disseminação do novo coronavírus. “Invasores não fazem home office e levam a Covid-19 para dentro das terras, violando o direito dos indígenas ao isolamento e ao refúgio durante a pandemia!”, disse. Ela lembrou que os garimpeiros e ladrões de madeira estão a poucos quilômetros das comunidades nas TIs Yanomami (RR) e Trincheira-Bacajá (PA), por exemplo.

Retirada imediata de invasores não foi acatada

No voto referendado hoje, Barroso determinou o isolamento e a contenção dos invasores que estão nas TIs Karipuna e Uru-Eu-Wau-Wau (RO); Kayapó, Munduruku e Trincheira Bacajá (PA); Araribóia (MA); e Yanomami (AM/RR). Apenas Edson Fachin votou no sentido de ampliar a decisão para determinar retirada imediata dos invasores dessas áreas, conforme o pedido original da Apib.

Apesar desse resultado, Barroso repetiu que é dever da União retirar invasores das TIs e que, se o governo não apresentar um planejamento para essas ações em tempo adequado, ele poderá “voltar ao tema”, ou seja, pode vir a exigir sua realização.

“A situação [é] calamitosa nessas sete Terras Indígenas que sofrem mais acentuadamente no ano corrente invasões de terras e desmatamento, fatos que agravam os riscos de contágio e elevam sobremaneira a mortandade dos índios”, avaliou Fachin.

O ministro reforçou que é possível viabilizar operações de retirada de grileiros, garimpeiros e exploradores ilegais de madeira com a adoção de protocolos de saúde adequados. Também pediu que fosse estabelecido um prazo de 60 dias, após homologação do plano de retirada de invasores, para que o governo efetivasse as operações.

O ministro Ricardo Lewandowiski já havia proposto um prazo de 60 dias para que o governo enviasse informações sobre as sete TIs e outros 120 dias para que apresentasse um plano com cronograma das operações. Afinal, nenhuma prazo foi definido para as duas ações.

Para não atender o pedido da retirada imediata de invasores, Barroso justificou que a organização de grandes operações leva tempo, demanda a articulação de diferentes instâncias dos governos federal e estaduais e que a falta de planejamento pode ter o efeito contrário, agravando a disseminação da pandemia nos territórios indígenas. Nesta quarta, o ministro chegou a dizer que essas ações podem ser efetivadas após a pandemia.

As organizações indígenas entendem que a retirada dos invasores é urgente e, como argumentou Fachin, as operações de fiscalização podem ser realizadas com os cuidados de saúde adequados.

O governo Bolsonaro paralisou todas essas operações nas TIs, exonerou e agora ameaça com processos administrativos os servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) que realizaram ações nessas áreas nos últimos meses.