NOTA DE REPÚDIO – Conselho Nacional das Populações Extrativistas contesta reunião entre ICMbio e parlamentares do Acre: “prejuízo inestimável à biodiversidade da Amazônia”

  junho 24, 2020

O Conselho Nacional das Populações Extrativistas, CNS, publicou no dia 18 de junho de 2020 uma nota de repúdio a mais um ataque aos territórios das comunidades tradicionais da Amazônia: o emprego da lógica de Ricardo Salles de “passar a boiada”, durante crise sanitária do covid-19 no Brasil.

Trata-se da reunião realizada em Brasília, DF, no dia 16 de junho de 2020 entre o presidente do ICMBio, Homero Cerqueira, com o vice-governador do Acre, Major Rocha (PSDB/AC) e parlamentares do Estado: o senador Márcio Bittar (MDB/AC), a deputada federal Mara Rocha (PSDB/AC) e o deputado estadual Luiz Gonzaga (PSDB/AC).

Os representantes da bancada ruralista foram pedir apoio do governo de Jair Bolsonaro ao PL 6.024/2019 da deputada Mara Rocha, que propõe alterar os limites da RESEX (Reserva Extrativista) Chico Mendes, retirando da Unidade de Conservação quase 8 mil hectares das terras públicas, localizadas nos municípios Assis Brasil, Brasiléia, Capixaba, Epitaciolândia, Rio Branco e Sena Madureira, para atender aos interesses dos produtores rurais e pecuaristas, que ocupam, ilegalmente, as terras públicas da Resex.

O PL ainda propõe mudança na categoria do Parque Nacional da Serra do Divisor para Área de Proteção Ambiental (APA), um prejuízo sem tamanho a biodiversidade ecológica, que ficará sujeita à exploração ilegal madeireira, desmatamento e pecuária, além de uma ameaça para povos indígenas na região.

Sob o comando do ministro Ricardo Salles, o ICMBio segue atuando em favor de quem é responsável pelo desmatamento na Amazônia: grileiros, madeireiros, garimpeiros e pecuaristas. Nesta reunião em Brasília, Cerqueira afirmou que em um mês apresentará uma “proposta de solução” ao conflito na Resex Chico Mendes; ou seja, em plena pandemia, ignorando a luta do CNS e dos movimentos sociais, contrários ao PL 6.024, em tramitação na Câmara dos Deputados.

“É inadmissível discutir regularização fundiária em plena pandemia. A reunião em Brasília evidencia os interesses do governo federal de “passar a boiada” na Amazônia. Essa nota de repúdio vem alertar que as ameaças à Amazônia continuam acontecendo no governo federal e no Congresso Nacional. Mas nós, povos da floresta, estaremos sempre atentos e vigilantes na resistência contra todo ataque que ameace a Amazônia, seus povos e comunidades tradicionais”, declara Dione Torquato, secretário geral do CNS.

Dione menciona as palavras de Ricardo Salles, que, em reunião ministerial no dia 22 de abril, usou o termo “passar a boiada” para indicar ações de flexibilização ambiental para ocupar terras públicas na Amazônia.

Ele reitera a importância da pressão social ao relembrar que a Câmara dos Deputados recuou de levar adiante as propostas fundiárias contidas do PL 2633, conhecido como o “PL da Grilagem” de terras públicas,  depois da crítica e pressão nas redes sociais dos movimentos e ativistas socioambientais de todo o Brasil.

A principal luta do CNS em tempos de pandemia, é garantir a vida das comunidades tradicionais e populações extrativistas. E defende que a discussão sobre regularização fundiária e ocupação de terras públicas precisam ser debatidas amplamente.

“Não é nada democrático o governo federal, por meio do ICMBio, forçar medidas governamentais, ouvindo apenas um lado dos envolvidos. Ainda mais grave, em plena pandemia, quando medidas de restrições de locomoção foram decretadas em portos, rodovias e estradas, para assegurar o isolamento social e a saúde das pessoas”, diz a nota de repúdio, publicada no dia 18 de junho de 2020.

O documento salienta que o MPF (6ª Câmara de Coordenação e Revisão), responsável pela Temática de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, vem atuando por meio de um conjunto de recomendações que exige ações emergenciais coordenadas e integradas dos órgãos públicos – até agora não há nenhuma atuação do ICMBio, em ações de segurança alimentar e cuidados para proteger as comunidades tradicionais, vulneráveis ao vírus na Amazônia, seu papel institucional como órgão de meio ambiente – sobretudo, a prevenção da disseminação de doenças, mas também na garantia do pleno atendimento à saúde, e pede ainda o controle sanitário das pessoas que ingressem nos territórios étnicos e comunidades tradicionais e a ampliação de política de distribuição de cestas básicas.

O CNS, mesmo em tempo de pandemia, com todos os cuidados sanitários necessários, irá mobilizar as Associações das Resex Chico Mendes e comunidades extrativistas, dos municípios Assis Brasil, Brasiléia, Capixaba, Epitaciolândia, Rio Branco e Sena Madureira diretamente atingidas com o PL 6.024/2019 da Deputada Federal Mara Rocha – a principal ameaça, hoje, a conservação da Resex Chico Mendes – para reagirem a proposta do ICMBio prometida à comitiva de parlamentares do Acre e ao governo do Estado.

Segundo o documento, o CNS conclama a sociedade civil brasileira, parceiros sociais e movimentos socioambientais indígenas e quilombolas da Amazônia e outras regiões do Brasil, para juntarem-se, nesta luta, em defesa da Resex Chico Mendes, denunciando em todo País as ameaças do governo federal por meio do ICMBio, do senador Márcio Bittar/MDB, da deputada Mara Rocha/PSDB, do deputado estadual Luz Gonzaga/PSDB e do Governo do Acre, que deveriam, em tempo de pandemia, priorizar suas ações públicas para garantir a “vida e saúde das famílias extrativistas” vulneráveis ao covid19, mas ao contrário, aproveitam a pandemia para atacar os territórios das comunidades tradicionais e a conservação ambiental.

O documento na íntegra pode ser acessado no site do Conselho.